segunda-feira, 16 de março de 2009

Pra que sentimento, já que inventaram o orkut?


Não somos mais pessoas, somos profiles.

Aqui, somos quem queremos ser. Assumimos os personagens que refletem os nossos anseios. Transmitimos a imagem que melhor se aproxima de uma perfeição possível. Nas fotos, somos extremamente felizes, lindos, descolados. Problemas? Ahh, pra que isso? Basta sorrir pra câmera que eles simplesmente desaparecem.
Nos identificamos em comunidades. Conhecemos pessoas novas, repudiamos e admiramos o outro pelo que ela escreveu (ou copiou) no “quem sou eu”.
Trocamos confidências, declarações, conversamos “baixinho”, através de depoimentos. O verbo depor assumiu um significado moderno, uma conveniência virtual.
Status de relacionamento é o termômetro da relação. É o outdoor do compromisso. Se nos “becos e vielas” da cidade virtual nos deparamos com um rosto escultural, que decepção ao devassar aquela “vida” e percebê-la “namorando”... hahaha, tem gente que casa mesmo sem casar, imagine! Adeus ao véu e grinalda. Caso haja o interesse, é logo do lado esquerdo que não desviamos a atenção. Há quem espere ansiosamente que aquelas letrinhas se transformem em solteiro(a) (leia-se: disponível no mercado). Não adianta mais sentir; pra namorar, tem que colocar no orkut. Não rola mais “ser”, tem que “estar” namorando. A primeira coisa que se faz quando o namoro termina é... tirar do orkut! Um casal quando briga, se vê na paranóia obsessiva de monitorar o orkut do parceiro pra não pagar vexame e “namorar sozinho”.
O orkut é a maneira mais simples de emoldurar nossas vidas e consequentemente de encarcerá-las. Pode ser um apêndice da realidade, um atalho ao ser-humano, mas geralmente é cela, é jaula, é limite.
Teclado e mouse são controles remoto da alma. Um dia sem internet, um dia perdido da vida. Bastam 24 horas sem olhar o orkut pra emergir a sensação de parte da vida indo embora.
Nesse universo paralelo, há a miraculosa oportunidade da reencarnação. Profiles que morrem dando, logo em seguida, vida a uma nova vida. Quantas vezes então, eu já pensei no “suicídio”?
No Orkut dá pra, inclusive, sermos dois, três, sermos vários, não sermos nós.
As pessoas acreditam em profiles. Já não vale mais a pena ser gente. Se não tá no orkut, é mentira; quem não tem orkut, não existe. Afinal, quem não tem orkut, não tem vida.